Mensagem da Dr.ª Matshidiso Moeti, Directora Regional da OMS para a África
Este ano, assinalamos o Dia Mundial de Luta contra o Paludismo enquanto lamentamos as 384 000 mortes evitáveis que foram imputadas a esta doença na Região Africana da OMS em 2020.
O tema retido para este ano é “Zero paludismo – fazer frente ao paludismo”, porque todos os casos de paludismo são evitáveis e todas as mortes por paludismo são inaceitáveis.
Em 2019, dos 229 milhões de casos de paludismo e 409 000 mortes por paludismo notificados no mundo, 94% foram registados na Região Africana da OMS. Isto apesar dos grandes progressos realizados na resposta ao paludismo na Região.
Entre 2000 e 2019, a incidência do paludismo diminuiu 29% e o número de mortes 60%. As disposições tomadas permitiram evitar a ocorrência de mais de 1,2 mil milhões de casos e 7,1 milhões de mortes na Região. Cabo Verde mantém o estatuto de país livre do paludismo desde 2018, a Argélia foi certificada como livre do paludismo em 2019 e o Botsuana, a Etiópia, a Gâmbia, o Gana, a Namíbia e a África do Sul alcançaram os marcos definidos para 2020, reduzindo a incidência e o número de mortes por paludismo em 40% comparativamente a 2015.
No entanto, 36 dos 44 países da Região endémicos de paludismo não atingiram estes marcos. No geral, a Região ficou 37% e 25% aquém dos objectivos estabelecidos em relação à incidência e aos óbitos, respectivamente. Embora a incidência do paludismo na Região tenha diminuído entre 9% e 10% a cada cinco anos, entre 2000 e 2015, nos últimos cinco anos esta taxa diminuiu para menos de 2%.
Cada ano em que deixamos o paludismo se propagar, a saúde e o desenvolvimento padecem. O paludismo é responsável por uma redução média anual de 1,3% do crescimento económico em África. Deste modo, e a título de exemplo, o absentismo associado ao paludismo e as perdas de produtividade causadas por esta doença custam todos os anos à Nigéria cerca de 1,1 mil milhões de dólares americanos. Estima-se que, em 2003, o impacto financeiro do paludismo no produto interno bruto do Uganda tenha sido equivalente a 11 milhões de dólares. No Quénia, o paludismo é responsável pela perda de cerca de 170 milhões de dias úteis no mercado de trabalho e por 11% das faltas registadas nas escolas primárias.
Para que esta situação mude, é preciso prestar um maior apoio às populações em risco. Em 2019, um em cada três agregados familiares em risco não dispunha de uma rede mosquiteira tratada com insecticida e 48% das crianças com menos de cinco anos não dormia sob uma rede mosquiteira tratada com insecticida. De todas as crianças com febre que se deslocaram a uma unidade de saúde para receberem cuidados, 31%
não fizeram o teste ao paludismo, contrariando assim as recomendações feitas pela OMS quanto à necessidade de testar todos os casos de febre em zonas endémicas.
Constatou-se também que duas em cada três mulheres grávidas não receberam três ou mais doses de tratamento preventivo intermitente para a doença. Esta falta de protecção contribuiu para 11,6 milhões de casos de paludismo em mulheres grávidas que deram à luz 822 000 crianças com baixo peso em 33 países.
Também se vislumbra novos desafios no horizonte, como a crescente resistência dos vectores aos insecticidas na Região. Isto poderá comprometer a eficácia de intervenções, como as redes mosquiteiras tratadas com insecticida e a pulverização intradomiciliária com efeito residual longo. A resistência dos parasitas do paludismo a alguns medicamentos também pode tornar esta doença muito difícil de tratar.
Foram recentemente detectadas mutações genéticas no parasita do paludismo (deleções no gene pfhrp2/3) no Corno de África, que poderiam aumentar o número de testes ao paludismo com resultados falso-negativos. O mosquito Anopheles stephensi, um vector do paludismo em zonas urbanas, invadiu o Corno de África nos últimos anos, sendo susceptível de causar surtos devastadores nas cidades e vilas.
São, portanto, necessárias medidas urgentes para travar o flagelo desta doença e para nos aproximarmos dos objectivos mundiais definidos para o paludismo, nomeadamente a redução em 90% do número de casos e mortes imputáveis a esta doença até 2030. Devem também ser feitos investimentos para garantir um maior acesso às intervenções de combate ao paludismo por parte dos grupos negligenciados, como as crianças e as grávidas. Além disso, é importante que a implementação das intervenções seja bem pensada de modo a proteger a eficácia das ferramentas antipalúdicas, e que sejam adoptadas soluções inovadoras para responder de forma proactiva aos desafios que se avizinham.
Estamos entusiasmados com os resultados alcançados com a implementação experimental da vacina contra o paludismo RTS,S. Em 18 meses, o Gana, o Quénia e o Maláui conseguiram administrar mais de 1,7 milhões de doses, atingindo aproximadamente os mesmos níveis de cobertura populacional que outras vacinas. Trata-se de outro instrumento promissor na prevenção do paludismo.
A OMS está a colaborar com os países para estudar os motivos por trás da estagnação dos progressos verificada nos últimos cinco anos. Convidamos as partes interessadas de cada país endémico a juntarem-se para descobrir que iniciativas estão a cumprir os seus objectivos e o que pode ser feito de forma diferente para alcançar as metas definidas para 2030.
Precisamos de trabalhar juntos para mudar a percepção que se tem do paludismo enquanto problema de saúde de modo a que esta doença também seja encarada como uma ameaça ao desenvolvimento socioeconómico que só poderá ser travada com uma resposta multissectorial.
Se toda a sociedade for envolvida na luta contra o paludismo, poderemos garantir juntos um futuro próspero às sociedades, às economias e à população africana.